sexta-feira, 6 de abril de 2012

A nova economia inovando as ciências e as artes - parte 1 de 2

A nova economia inovando as ciências e as artes

- parte 1 de 2


Aquele leitor mais atento pode estranhar o fato de que eventos tão complexos, como as grandes navegações e exploração das colônias, estarem registrados em um período tão imediatamente após a Idade Média, onde o mundo feudal impunha relações sócio econômicas muito fechadas, poder político muito fragmentado, mentalidade, meios de comunicação e educação controladas pela Igreja, além de técnicas gerais de trabalho e transporte muito atrasadas e rudimentares. Existe até uma visão bastante tradicional, e hoje muito combatida, de que a Idade Média, em função desse caráter hermético e controlado do conhecimento teria sido a “Idade das Trevas”.6

A explicação para essa aparente contradição reside no fato de que ao mesmo tempo em que todos esses eventos se desenrolavam, ocorria na Europa um movimento urbano burguês que de certa forma dava sustentação ideológica e ao mesmo tempo possibilitava um maior desenvolvimento das artes, técnicas e difusão da cultura. Deu-se a esse movimento o nome de Renascimento Cultural.

É bom lembrar que o próprio termo “renascimento” é desqualificador do período anterior, a Idade Media, e está inserido naquela lógica de associar a era medieval com atraso.

Essa expressão está ligada à retomada, ou renascimento, dos valores estéticos culturais da antiguidade clássica (Grécia e Roma), pois acreditava-se que nesse período teria ocorrido um profundo desenvolvimento intelectual e artístico da humanidade, características essas que teriam ficado esquecidas no período medieval, principalmente por causa do domínio ideológico da Igreja católica, que em função de sua doutrina própria, explicava os fenômenos da natureza e as relações sociais vinculadas diretamente a vontade divina (o teocentrismo), interpretada e intermediada, é claro, por seus representantes oficiais (papas, cardeais, bispos e padres), o clero.

O Renascimento cultural, de forma resumida, se caracteriza portanto como um movimento que ocorreu sobretudo nas cidades entre os séculos XIV e XVI e atendia melhor aos interesses da burguesia, pois a atividade comercial implica na valorização do indivíduo como responsável, e único beneficiário, de seu trabalho, valorização das questões materiais e também da razão, mesmo que por interesses comerciais e financeiros (obtenção de lucros através dos empréstimos, juros, investimentos, etc.). Todas essas características se opunham à mentalidade medieval teocêntrica mas, de forma indireta, também norteavam as ações de artistas, cientistas e intelectuais renascentistas.

Em linhas gerais as principais características do renascimento cultural europeu seriam:
a) o antropocentrismo: para os renascentistas, e seguindo o modelo greco-romano, o homem era a mais bela obra deixada pela natureza e, portanto, deveria de ser entendido como o centro irradiador do conhecimento, capaz de assumir e pensar o mundo a sua volta e apto, ele também, de realizar e se responsabilizar por obras importantes ao desenvolvimento individual e coletivo.

b) o humanismo: se confunde muito com o item anterior. Um humanista era aquele que resgatava os antigos textos clássicos e a partir disso valorizava em muito o ser humano como agente ativo de suas obras. A visão humanista concebe o conhecimento como universal e não especializado e especifico como nos dias atuais7. O humanismo também é característica fundamental do estilo literário predominante da época, o classicismo;

c) o individualismo: a concepção renascentista de mundo valorizava em muito a produção individual, atribuindo ao homem todos os frutos do sucesso ou fracasso de sua obra. Isso explica, por exemplo, porque os artistas desse movimento assinavam suas obras, comportamento diverso da arte medieval que valorizava o anonimato pois considerava toda produção artística como sendo responsabilidade de Deus;

d) o otimismo: o renascentista, por acreditar na capacidade criadora do homem, tinha uma visão bastante otimista da vida, apreciavam a beleza da natureza e da obra humana, e retratavam tudo isso em quadros, livros e esculturas;

e) o racionalismo: ligado a todos os elementos já discutidos, os renascentistas valorizavam o uso da razão para explicação dos fenômenos da natureza e também entendimento das relações estabelecidas pelo homem. Não aceitavam passivamente as justificativas e explicações simplórias que usavam Deus para se entender tudo;

f) retomada dos valores da antiguidade clássica: como já dito, o modelo ideal adotado pelos artistas renascentistas, foi aquele práticado na Idade antiga por gregos e romanos. Esse modelo era baseado na perfeição de formas, com o uso de perspectiva e valorização da anatomia humana sem a preocupação moral cristã de se esconder corpos, ou traços que pudessem transparecer sensualidade ou expressões tidas como profanas.


Ilustração 8: Quadro do pintor renascentista Andrea Mantegna. Repare que apesar da temática religiosa, o corpo de Cristo é retratado com perspectiva e riqueza de detalhes da anatomia humana. Fonte: http://www.educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/os-valores-renascimento.htm

6 Hoje são inúmeros os exemplos que combatem a idéia de Idade Media ligada a um período obscuro, onde as artes e ciência não teriam se desenvolvido. Citando alguns poucos exemplos, nesse período, surgiram universidades, estilos arquitetônicos (gótico e românico), literatura e pintura (Dante Alighieri e Giotto), a filosofia escolástica, cientistas importantes (como Roger Bacon), produção cultural, mesmo que em mosteiros, que demonstram ser a Idade Média um período de intensa produção do conhecimento e inovação cultural, bem longe, portanto, da noção de obscurantismo que alguns autores defendiam.

7 Leonardo da Vinci, por exemplo, além de ter pintado obras conhecidíssimas (A santa ceia, Monalisa), era também botânico, arquiteto, poeta, músico, fez descrições precisas sobre circulação sanguínea, nervos óticos, estruturas musculares e esqueleto humano, além de fazer esboços pioneiros de maquinas que só seriam utilizadas séculos depois como escafandro, helicóptero e submarinos.


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